terça-feira, 12 de junho de 2012

"Martha Marcy May Marlene" - os limites da identidade

Ser reconhecido na sua primeira grande incursão na realização pelo Festival de Sundance pode ser o melhor cartão de visita para Sean Durkin, autor de Martha Marcy May Marlene. Logo na abertura, o espectador é confrontado com uma imagem que nos confunde no tempo e no espaço. No meio de várias jovens, que só jantam à mesa depois de os homens o terem feito, há uma que se destaca - Martha, do título da película (os restantes nomes são parte integrante da manipulação psicológica identitária levada a cabo pelo líder da "comunidade" de que a jovem faz parte). Cedo nos apercebemos de que todos pertencem a uma seita que vive nas margens da sociedade, na qual todos têm um papel a cumprir e partilham as mais variadas tarefas, além de dormirem juntos, vestirem as mesmas roupas e fazerem sexo entre si, sem distinção. Um dia, Martha decide fugir e é a partir daqui que vamos descobrindo a sua história, as suas origens e a razão de só agora ter dado notícias à única família que lhe resta: a sua irmã mais velha. Através de imagens soltas, entre o passado e o presente, o espectador vai juntando as peças do puzzle.

Sean Durkin opta por uma estética fria, com imagens cruas que nos conduzem à essência da seita liderada por Patrick (uma interpretação perturbadora de John Hawkes), um homem franzino que, fazendo uso de uma retórica persuasiva, espalha misticismo e domina todos os que chegam à comunidade em busca de se sentirem parte de algo. Ali, pensam ter chegado ao paraíso, onde são valorizados e acarinhados, sentindo que têm um papel que a sociedade lhes negou. As raparigas são "iniciadas" pelo líder e o poder subliminar é tal que, depois de serem violadas sob o efeito de drogas, continuam a sentir-se "especiais". Fazendo a ponte para o presente, Martha tenta agora viver uma vida "normal" com a irmã e o marido a quilómetros de distância do local da seita, sem ter noção de que os seus comportamentos não se encaixam nos parâmetros aceites pela sociedade. Perdida entre os padrões subvertidos daquela comunidade desviante e a segurança que uma vida "normal" lhe pode proporcionar, mas na qual não se encaixa, Martha fica presa entre o que é efectivamente realidade e aquilo que toca o campo da paranóia.

Destaque para a promissora Elizabeth Olsen que imerge na personagem que dá nome ao filme de forma absorvente, envolvendo-nos nas suas estranhas e deslocadas crenças, nos seus medos e na sua espartilhada identidade. Um filme interessante e algo perturbador.

Trailer de "Martha Marcy May Marlene", de Sean Durkin


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