segunda-feira, 30 de setembro de 2019

Estado da Nação (30) - Um País desgovernado por quem se governa a si próprio: o poder dos discípulos de Sócrates (2)

Jorge Costa Oliveira, Secretário de Estado da Internacionalização, demitiu-se do cargo no dia 9 de julho de 2017. O motivo? O caso Galpgate: pediu a constituição de arguido (motivo igual alegou João Vasconcelos, já falecido). Razão invocada pelo próprio? "Não prejudicar o Governo".

Fernando Rocha Andrade, Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, demitiu-se do cargo no dia 9 de julho de 2017. O motivo? Pediu a constituição de arguido no caso Galpgate. Razão invocada pelo próprio? "Não prejudicar o Governo".

domingo, 29 de setembro de 2019

Estado da Nação (29) - Um País desgovernado por quem se governa a si próprio: o poder dos discípulos de Sócrates (1)

Rui Roque, adjunto para os Assuntos Regionais do primeiro-ministro, demitiu-se do cargo em 25 de outubro de 2016. O motivo? O despacho de nomeação referia que era licenciado, quando não era. Razão invocada pelo Governo de Costa? Não divulgada. Às vezes, para manter o Poder a todo o custo, é preferível assobiar para o lado e fazer de conta que nada se passou. 

Nuno Félix, chefe de gabinete do Secretário de Estado da Juventude, demitiu-se do cargo em 28 de outubro de 2016. O motivo? O despacho de nomeação referia ter duas licenciaturas, que, na verdade, não terminou. Razão invocada pelo Governo de Costa? Não divulgada. Às vezes, para manter o Poder a todo o custo, é preferível assobiar para o lado e fazer de conta que nada se passou.

sábado, 28 de setembro de 2019

Estado da Nação (28) - Cancro nos corredores

«Todos os dias a realidade acentua o carácter criminoso de um sistema político que gasta dinheiro em golas inflamáveis quando não o aplica na Saúde. Por estes dias, nove doentes com cancro, alguns em fase terminal, estavam arrumados no corredor do serviço de Medicina no Hospital de Santa Maria. O hospital, para lá de não ter quartos onde meter pessoas que vivem os últimos dias da sua vida, não dispunha de almofadas para lhes dar um conforto mínimo no sofrimento. Querem que celebremos o quê? O menor défice em democracia? Só se fosse de compaixão, humanismo e decência (...).»
Eduardo Dâmaso, Sábado (Editorial de 26 de setembro)

sexta-feira, 27 de setembro de 2019

"Thor: Ragnarok" - sangue novo de Taika Waititi

Quando já pensávamos que dos filmes da Marvel nada de novo poderíamos esperar, Taika Waititi troca-nos as voltas e insufla sangue novo na série Thor.

Neste último episódio, o entretenimento é garantido num argumento simples, mas original, e graças a uma realização com personalidade.

Thor é preso noutro lado do universo sem o seu martelo poderoso e vê-se numa corrida contra o tempo para regressar a Asgard e impedir o Ragnarok - a destruição do seu planeta e o fim da civilização asgardiana, agora nas mãos de uma nova ameaça, a implacável Hela, irmã de Thor.

O filme é tão sério e profundo quanto isso. Mas é, em boa verdade, um objeto honesto que só pretende divertir e, nesse sentido, cumpre plenamente os seus objetivos.

quinta-feira, 26 de setembro de 2019

"Annabelle 2: a criação do mal" - filme de terror exemplar


David F. Sandberg assina mais uma prequela da saga iniciada pelo mestre James Wan, conseguindo a proeza de absorver e aplicar o livro de estilo dos filmes de terror sem ser redundante ou aborrecido. A realização é, de facto, exemplar e com pormenores que evidenciam mão de mestre.

quarta-feira, 25 de setembro de 2019

Banda sonora para o outono (39) - Lloyd Cole: "Guesswork"

Eis o primeiro grande disco para o outono que agora começa. Estivessem as estações do ano a revelarem os padrões que outrora as definiam e as canções de Lloyd Cole seriam a banda sonora melancólica perfeita.

Cantautor veterano, poeta de primeira água e compositor inspirado, Cole talvez seja o maior herdeiro de Leonard Cohen. 

Guesswork está aí para se tornar um clássico. Neste álbum, o autor de Rattlesnakes (1984) experimenta sonoridades eletrónicas com a classe e a sofisticação a que nos habituou desde aquele disco seminal. Ouça-se, com a atenção que o artista britânico merece, as canções Night sweats, Violins, The afterlife e When I came down from the mountain, momentos de génio de uma obra sublime.

terça-feira, 24 de setembro de 2019

Adeus, Ric Ocasek (1944-2019)


Com os The Cars, marcou o som das décadas de 70 e 80. Mas Ric Ocasek destacou-se também como produtor e autor de um excelente álbum a solo - This side of paradise (1986). Nos últimos anos de vida, dedicou-se à poesia e à pintura.

segunda-feira, 23 de setembro de 2019

Estado do Mundo (50) - Distopias politicamente corretas: os novos fundamentalismos


Rex Goldsmith, dono de uma peixaria famosa em Londres, viu algumas das fotos dos seus peixes, que partilhou no Instagram, serem censuradas e classificadas como "perturbadoras". Ele não encontra explicação, mas suspeita que a condenação das suas fotografias seja da responsabilidade de vegans fundamentalistas.

domingo, 22 de setembro de 2019

"Dor e Glória" - de Pedro Almodóvar


A memória foi sempre a matéria-prima dos filmes do período de maturidade de Almodóvar. Enquanto cinéfilo adolescente, nos idos de 80 do século anterior, nunca me deixei conquistar pelo então jovem cineasta espanhol. Negros hábitos (1983), Que fiz eu para merecer isto? (1984), Matador (1986), A lei do desejo (1987), Mulheres à beira de um ataque de nervos (1988) ou Ata-me (1989) eram, para mim, filmes sobrevalorizados de um realizador histriónico.

Tudo mudou quando vi, no saudoso Cinema Nun'Álvares, no Porto, o thriller negríssimo Em carne viva (1997). Percebi, então, que Almodóvar se tornara um autor maduro que aprendera a apurar a escrita e o sentido estético. De resto, neste momento, julgo que Almodóvar é, com De Palma, o maior herdeiro de Hitchcock.

Dor e Glória, o seu mais recente filme, não está à altura do filme que destaquei (assim como de Tudo sobre a minha mãe (1999) ou Julieta (2016)), embora seja talvez a obra mais pessoal de Almodóvar. Conta-nos acerca da crise existencial de um realizador de meia idade que, a pretexto do restauro, pela Cinemateca de Madrid, do seu filme mais célebre, passa em revisão as vivências mais marcantes do seu passado: a infância pobre na aldeia natal, a ida forçada para o seminário, a descoberta da identidade sexual, o sonho de viver na capital, o amor da sua vida, a morte da mãe e o regresso às raízes.

Estamos perante uma espécie de "Almodóvar 8 1/2". Mas não nos deixemos enganar por esta referência, pois a analogia com o clássico de Fellini fica-se por aí, pela superfície da sinopse e pela desmontagem do artifício cinematográfico no plano final (belíssimo, diga-se de passagem). Neste sentido, Dor e Glória é, objetivamente, obra almodóvariana: nas personagens, nas cores garridas a evocar o technicolor clássico e a Pop Art, no rigor formal, na banda sonora, no humor ácido e até no experimentalismo contido (veja-se a sequência de animação, que resolve em três tempos grande parte da história das dores e glórias do protagonista).

Antonio Banderas parece ter esperado toda a carreira por este filme, confundindo-se inteiramente com a personagem que interpreta. Será, com certeza, um dos melhores filmes de 2019. Mas há algo de excessivamente transparente nesta assumida autoficção (Salvador Mallo bem podia chamar-se Pedro Almodóvar, tantos os episódios e referências da sua vida que se confundem com a biografia do próprio realizador; a exposição das fotografias dos pais de Almodóvar no quarto da mãe de Salvador torna tudo demasiado evidente) que coloca Dor e Glória alguns passos aquém do estatuto de obra-prima.

quinta-feira, 19 de setembro de 2019

"David Lynch: a vida arte" - um documentário de Jon Nguyen, Rick Barnes e Olivia Neergaald-Holm

Documentário discreto e intimista (tanto quanto o complexo Lynch terá permitido) sobre o icónico artista norte-americano, é uma porta de entrada para o seu universo, sobretudo enquanto pintor, mas que deixa a porta do quarto apenas ligeiramente entreaberta, nunca nos permitindo, portanto, aceder plenamente às motivações por detrás dos seus filmes, música e livros. Ficamo-nos pelos seus quadros e terminamos com a recordação do ano em que concluiu a sua primeira longa-metragem, Eraserhead. Claro que há por aqui delicadas memórias de infância, confissões sobre crises de identidade, conflitos com os pais, lembranças que remetem para o universo de Veludo Azul, mas fica a sensação agridoce de que queríamos saber muito mais acerca dos seus filmes pós-Eraserhead. Ainda assim, é sempre melhor uma obra sobre Lynch do que nenhuma.

quarta-feira, 18 de setembro de 2019

"Baby Driver: Alta Velocidade" - uma fulgurante primeira meia hora

Baby é um hábil condutor de automóveis, apesar do seu ar imberbe, com uma dívida a um mafioso que o obriga a pagá-la mediante prestações que implicam a participação, como motorista, em assaltos. Baby marca o ritmo dos assaltos a partir de música minuciosamente selecionada no sei iPod, a qual surge como supressão de um problema auditivo que o faz sentir um zumbido constante nos ouvidos.

Eis a promissora premissa de Baby Driver: Alta Velocidade, que o realizador britânico Edgar Wright pretende que seja visto como um musical de ação. Mas a fulgurante primeira meia hora de filme é rapidamente desperdiçada em mais 90 minutos marcados pelo vazio de ideias e por personagens de plástico que, por muito que sejam (bem) defendidas por atores competentes, nunca perdem o tom cartoonesco nem adquirem um leve rasgo de humanidade. No fundo, Baby Driver surge na linha do mais vulgar filme da Marvel.

Curiosamente, Wright não soube como aproveitar a inspiração do saudoso The Driver, filme que Walter Hill (que tem um breve cameo em Baby Driver) realizou magistralmente em 1978. 40 anos depois, ainda não há cineasta à altura de Hill.




terça-feira, 17 de setembro de 2019

"Os incorruptíveis contra a droga" - Um policial nervoso, de William Friedkin


The french connection é talvez o melhor policial da história do cinema. Pleno de grão, de rugosidade, de névoa, de uma luz escura, é um filme cru. Sem contemplações com a beleza estética ou interessado em agradar ao público, Friedkin constrói uma película assertiva, roçando por vezes a forma do cinema documental direto ao osso (veja-se a cena inicial no bar repleto de clientela pouco recomendável e no modo como o realizador filma o grupo de soul music que nele atua).

Nesta obra não há propriamente bons e maus, há sim narcotraficantes e polícias empenhados na sua missão. E há um Gene Hackman, como sempre, a interpretar como se disso dependesse a redenção da humanidade. Ah!, e há uma cena verdadeiramente antológica, em que o icónico detetive Popeye Doyle persegue, de automóvel, o metro pelas ruas sujas da Nova Iorque da década de 70. De um realismo pulsante e capaz de envergonhar qualquer sequência de perseguição da série Velocidade Furiosa. Curiosamente, esta cena só tem paralelo na de outro filme de Friedkin, realizado na década seguinte, Viver e morrer em Los Angeles.

segunda-feira, 16 de setembro de 2019

"Paulina na Praia" - Um verão, por Eric Rohmer


Porque é que ainda vale a pena revisitar o Rohmer de Comédias e Provérbios, ciclo de filmes assinados pelo admirável realizador francês na já longínqua década de 80 do século passado? Porque a simplicidade singular do seu cinema seria válida ainda hoje.

Em boa verdade, a história dos amores de verão de uma adolescente e da sua tia tem um lado folhetinesco tão apelativo hoje como há quase 40 anos atrás. Depois há a espontaneidade de uma narrativa que capta, conta e vai revelando as camadas das personagens (só aparentemente lineares) sem as julgar. 

Sim, como sempre, Rohmer moraliza sem julgar, como se se tratasse tão-só do humano que há em todos nós. E, nessa humanidade, o desejo vai-se sobrepondo à romantização das intenções.


Breves notas sobre o cinema de Wong Kar Wai (6) - "Disponível Para Amar" (2000)

E, no ano da graça de 2000, Wong Kar Wai alcançou o zénite da sua (sétima) arte com a obra-prima Disponível Para Amar . É (mais) uma históri...