Bruno Barreto regressa ao grande cinema que marcou o início da sua carreira, após um período ao serviço de Hollywood, do qual resultou o falhadíssimo "Altos Voos".
A partir de um acontecimento real - o sequestro dos passageiros do autocarro que dá nome ao filme - a película em análise narra a história de dois jovens das favelas do Rio de Janeiro e de Copacabana, desde a infância miserável passada ao relento nas ruas até à adolescência marcada pelas drogas, roubos, prisão e pela lei das balas. Sandro e Alessandro são os personagens centrais desta obra que, de modo cru e despojado de artifícios, mostra ao espectador o Brasil que não tem lugar nas telenovelas nem aparece nos roteiros turísticos. Ao longo do filme somos transportados a um ritmo feérico e vertiginoso - qual samba das favelas - por um geografia emocional desenhada com o contorno dos morros onde se instalam os bairros de lata.
No fim, limitamo-nos a (re)conhecer as circunstâncias que conduziram ao acto irracional e impulsivo de Sandro: afinal, a decisão súbita de fazer dos passageiros do autocarro reféns não foi uma escolha planeada, tendo sido antes resultado de uma série de acasos e de oportunidades sociais não aproveitadas. Bruno Barreto tem a capacidade de evitar o maniqueísmo, não culpabilizando directamente algo ou alguém (até porque essa seria a via mais fácil) pelos rumos das vidas de Sandro, Alessandro e de tantas outras crianças que crescem nas favelas por entre a violência mais brutal e inimaginável, a qual por vezes nos faz esquecer que o Brasil é um Estado de Direito democrático.
Uma última palavra para a excelência dos actores, que nos fazem acreditar sempre nos seus personagens, e para a fotografia repleta de luz e cores quentes, conseguindo apreender os lugares, as paisagens e as pessoas e, desse modo, contribuir para o realismo nu e cru do filme.
Trailer de "Autocarro 174", de Bruno Barreto
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